segunda-feira, 13 de junho de 2011

Morte e vida do centro de Belo Horizonte

Carlos Alberto Maciel
(originalmente publicado em: Hoje em dia, Belo Horizonte - MG, p. 10 - 10, 16 mar. 2008.)

Todas as grandes cidades brasileiras assistiram, ao longo dos anos 70 a 90, a um mesmo fenômeno de envelhecimento, esvaziamento e degradação de suas áreas centrais. Belo Horizonte não foi diferente. Embora a cidade tenha pouco mais de um século, sua região central já foi construída e reconstruída pelo menos três vezes.
Sua primeira fase coincide com o momento de implantação da cidade. Datam deste princípio algumas construções baixas, como os sobrados da rua dos Caetés, de dois pavimentos, com o comércio ao nível da rua e a moradia no andar superior. Por sua menor altura, estes edifícios resguardavam a hierarquia e o valor de comando da paisagem urbana exercidos pelos edifícios públicos e igrejas.
Não mais do que trinta anos após a formação inicial da cidade, o centro começa a testemunhar uma progressiva substituição de seus edifícios inaugurais. Data do final dos anos 20 e início dos 30 a construção dos primeiros arranha-céus, ambos projetados pelo arquiteto Angelo Murgel: o primeiro, o edifício Ibaté, à rua São Paulo com Afonso Pena, de nove andares. Depois o Cine Brasil, na praça Sete. No terraço acima dos seus dez andares toda a população belorizontina passeava para ver a cidade do alto, aproveitando ainda para usufruir da grande novidade tecnológica daqueles tempos: o elevador. Este edifício, então o mais alto da cidade, vinte anos depois tornou-se – como vemos ainda hoje – um dos mais baixos da praça. Dos anos 40 aos 60, a terceira ocupação do centro, movida pela possibilidade de criação de solo artificial que o elevador passou a permitir, destruiu parte significativa da cidade inicial para implantar os grandes edifícios modernos, com alturas próximas dos vinte andares. Ainda nos anos 40 o Edifício Acaiaca rompeu a escala baixa do centro e ultrapassou radicalmente a altura do monumento vizinho, a Igreja de São José. Nesse momento, os monumentos perderam sua importante função de domínio e comando da paisagem para os edifícios comuns.
 Nos anos 50, a arquitetura de concreto e vidro, já hegemônica após o sucesso da Pampulha e de diversos outros grandes empreendimentos públicos em todo o país, difunde-se por toda a área central, em edifícios invulgares, de grande qualidade construtiva e arquitetônica, como o Banco Mineiro da Produção, de Oscar Niemeyer, ou o Banco da Lavoura, de Alvaro Vital Brazil, ambos na Praça Sete. É a época do bonde e do início da indústria automobilística no Brasil. Como o automóvel era um raro artigo de luxo, nenhum dos edifícios até então era equipado com áreas para estacionamento.
Mais uma vez, é o grande avanço tecnológico do momento, trazido pela industrialização do governo de JK – o automóvel –, um dos indutores da transformação dos centros de todas as cidades brasileiras. Despreparados para os efeitos colaterais do transporte individual, os centros viram as principais atividades produtivas se transferirem para outras regiões. Em São Paulo, para a Avenida Paulista; em Belo Horizonte, para a Savassi. Com edifícios novos, já equipados com áreas mais generosas de garagem e portanto coerentes com as novas demandas da vida cotidiana, as grandes empresas e a população de maior renda deixam para trás enormes edifícios de meia idade. Por sua escala, tornou-se difícil imaginar a sua substituição, como em outros momentos. Deixados para trás, às vezes abandonados de fato, têm seu envelhecimento e sua degradação acelerados. Com um estoque imobiliário maior do que a procura por espaços no centro, a região se esvaziou ao longo dos anos 70 a 90, o que também provocou a degradação urbana e a insegurança.
A tomada de consciência sobre a importância dos centros e sobre a necessidade de promover sua revitalização iniciou-se nos anos 80, ganhou força aos 90 e vem produzindo frutos recentemente. Em Belo Horizonte tivemos a sorte de termos aprendido com o protagonismo de outras cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, a reverter um estágio de degradação ainda não tão radical. Temos tido sorte também por assistirmos a generosas iniciativas privadas para a revitalização de edifícios, como o Cine Brasil. E, por último, e especialmente, por termos a oportunidade de usufruir de numerosas ações do poder público, planejadas e implementadas para recuperar a vitalidade e a segurança do centro, restaurar seu patrimônio edificado e urbano, refazer seus espaços públicos, reocupar seus edifícios e, com isso, contribuir para resgatar as virtudes da vida urbana, democraticamente.

Arquitetos Associados

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